5 de fev. de 2013

Nota oficial conjunta do CEPED - ALBRASCI

Infelizmente vivenciou-se no Rio Grande do Sul, Brasil, em 27/01/2013, um dia que irá ficar tristemente marcado no nosso calendário, uma enorme tragédia, que traumatiza toda a sociedade gaúcha e brasileira.

O incêndio ocorrido na boate Kiss, em Santa Maria, cidade situada a cerca de 260 km de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, durante uma festa de jovens universitários, acarretou um grande número de mortes, estimado inicialmente em 232, com chances de incremento. 

Neste momento nossos corações se voltam entristecidos para os familiares, abalados pela perda de tantos jovens com diversos projetos de vida para o desenvolvimento do país. 

Para honrar a memória dessas vítimas é fundamental que essa tragédia mobilize toda a estrutura pública e a comunidade técnica para que entendamos bem o que aconteceu e tiremos lições que mudem o panorama e evitem novas tragédias.


Os primeiros relatos de sobreviventes e testemunhas indicam que uma série de fatores (como ocorre em todas as tragédias, as causas contribuintes acabam sendo múltiplas) parece ter colaborado, em dada medida, para que esse desastre se consubstanciasse: o uso indevido de elementos inflamáveis (sinalizador) em espaços confinados; o subdimensionamento e a sinalização inadequada das rotas de evacuação; o despreparo e falta de treinamento para lidar com emergências dos funcionários; bloqueios da saída por seguranças e material; problemas de funcionamento de extintores e o uso de materiais de revestimento inflamáveis, que propagam o fogo e geram muita fumaça. 

São necessárias ações que busquem entender o que aconteceu e verificar qual a contribuição de cada um desses fatores e de outros que possam ser identificados. É fundamental aprender para evitar que algo desse gênero se repita. 

É notório, porém, que, de certa forma, essa acaba sendo uma tragédia anunciada. Há algum tempo os especialistas da área de incêndio, inclusive componentes do Corpo de Bombeiros, vem discutindo os perigos existentes e a necessidade de se avançar em vários aspectos ligados à prevenção de incêndios. A verdade é que nossa sociedade não tem uma adequada percepção dos riscos associados ao uso seguro das edificações. 

Observam-se, na mídia brasileira, diversos casos de estoques inadequados e ilegais de gás ou outros materiais inflamáveis e explosivos; falta de controle sobre fogos de artifício; sobrecarga de redes elétricas; uso de materiais com propriedades inadequadas em móveis e revestimentos; ausência de manutenção, subdimensionamento ou obsolescência dos sistemas de combate a incêndio; níveis inadequados de capacitação e atualização específicos dos profissionais envolvidos nos projetos e na fiscalização. Isso gera um estado de risco potencial grave, mas que não é percebido. 

No Brasil, há boas normas técnicas e regulamentos de Corpos de Bombeiros detalhados em vários estados brasileiros. É preciso conhecê-los e respeitá-los. Existe, no entanto, uma clara necessidade de criar na Sociedade Brasileira uma cultura da segurança contra incêndio a fim de exigir o cumprimento dos requisitos legais.

Há necessidade de ampliarmos o número de especialistas em segurança contra incêndio por meio de disciplinas regulares nos cursos de engenharia e arquitetura nas universidades brasileiras.

Há necessidade de uniformizar a regulamentação de segurança contra incêndio em todos os Estados brasileiros, tomando como base as melhores técnicas.

Há necessidade de criação de centros científicos de referência em todas as regiões do Brasil, para a produção do conhecimento específico necessário e para dar suporte à certificação dos materiais e equipamentos de segurança contra incêndio.

Há necessidade de ampliar ou modernizar as normas técnicas sobre segurança contra incêndio, assim como são necessárias ações continuadas de atualização e capacitação técnico-científico, e estratégias de conscientização da sociedade e das autoridades públicas de que o risco de incêndio é permanente e evolui com a tecnologia...

Todos devemos ser responsáveis por condutas seguras e preventivas, sendo especialistas na área ou não. Afinal, é doutrina da área que um incêndio só ocorre porque a prevenção falhou... 

O alerta de que é necessário atentar para a Segurança contra Incêndio não é novo... 

Lembremos dos incêndios do Andraus e do Joelma, na década de 70, em São Paulo e das Lojas Renner, em 1976, no próprio Rio Grande do Sul. Desde então muito foi feito, mas ainda é necessário fazer mais...

A gestão da segurança contra incêndio e pânico necessita de subsídios técnicos e científicos para a sua melhoria contínua, para que evitem infortúnios dessa natureza.

Esta é uma hora de pesar para toda a sociedade brasileira, e a maior homenagem que podemos fazer à memória das vítimas é atuar fortemente para reduzir significativamente as oportunidades de que novos desastres desse tipo possam acontecer...

Porto Alegre, 27 de janeiro de 2013

CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM DESASTRES (CEPED/RS - UFRGS)

ASSOCIAÇÃO LUSO-BRASILEIRA PARA SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO (ALBRASCI)